terça-feira, 20 de abril de 2010

Entrevista: Dom Augusto fala sobre as expectativas para um novo momento na sua vida


Dom Augusto fala sobre a experiência do Jubileu de Ouro, os desafios do sacerdócio nos tempos atuais e sobre o contato com o próximo bispo de Floriano.

O que levou o senhor a visitar todas as dioceses por onde passou?

O meu coração pedia que pudesse visitar essas comunidades, onde eu dei os primeiros passos no meu ministério sacerdotal e também episcopal. É uma atitude de um coração agradecido a Deus que me colocou no meio de tantas pessoas dessas comunidades para juntos tentarmos e construir o Reino de Deus.

O que o senhor destaca como principais conquistas durante esses cinquenta anos de sacerdócio?

Eu tive a graça de ser ordenado sacerdote num período em que a Igreja já estava marcada por uma corrente de pensamentos, um trabalho que acontecia entre os teólogos, entre pastoralistas, visando uma presença melhor da Igreja no Mundo. Participei durante o período de formação de movimentos em que ia acontecendo reforma litúrgica e esse movimento foi coroado com a convocação do Concílio Vaticano II, que pedia um acento muito forte na participação dos leigos, na presença da Igreja no mundo, e tudo isso foi ajudando a que a gente fugisse um pouco do esquema tradicional de uma Igreja presente num território físico, mas o Concílio pediu uma presença missionária, uma presença mais participativa de todos. Isso foi muito bom, porque neste mesmo período de vida sacerdotal de episcopal que aconteceu o surgimento das Comunidades Eclesiais de Base, o movimento do povo mais organizado, mais bem articulado e isso tudo favorecia enormemente ao padre trabalhar melhor e trabalhar sabendo que ele tinha colaboradores inestimáveis, sobretudo na área do laicato.

Experiência como sacerdote

Para mim foi uma experiência muito importante, eu assumi inicialmente duas paróquias, Simplício Mendes e Paulistana, que somavam 10.000 km ² e a gente fazia um trabalho de assistência às comunidades para atender a batizados, casamentos, atender os moribundos. Não havia chance nem tempo suficiente para desenvolver uma ação catequética, formação bíblica, era um desgaste físico que ia abafando idéias que a Igreja estava propondo naquele período. Mas graças a Deus o bispo da época, dom Edilberto, nos permitiu uma iniciar uma experiência de presença diferente nas comunidades e eu diria que foi a salvação do sacerdócio, porque eu tive muitos colegas que na época do Concílio se desencantaram com a prática da Igreja no exercício do ministério sacerdotal, e muitos saíram deixaram o sacerdócio, e eu consegui por graça de Deus dar continuidade ao meu trabalho.
Experiência como bispo

A Igreja me chamou para exercer o ministério episcopal, eu comecei em Picos com uma enorme preocupação, mas eu me convenci ao longo de todo trabalho feito aqui, de que a Igreja não pertence a nenhum bispo, a nenhum padre particularmente, mas é guiada acima de tudo pelo Espírito de Deus e somente assim podíamos vencer as dificuldades. Como trabalhar em uma diocese com apenas cinco padres? Então ficava muito claro que eu deveria partir para convocar os leigos e entregá-los o papel que realmente era próprio deles na Igreja, não um trabalho que viessem a fazer para agradar o bispo, o padre, mas pela própria vocação batismal. Isso foi um enriquecimento muito grande na minha vida, eu pude testemunhar o surgimento de vários leigos nas comunidades, assumindo a celebração da palavra, animação do povo, organização de conselhos administrativos nas paróquias e nas comunidades.

Momentos fortes

Destacaria também nesse período de vida sacerdotal que é gratificante demais poder exercer um papel em que você é instrumento para que Deus faça o bem às pessoas. Por exemplo: atender um doente terminal, o que significa isso? Era o ato mecânico de dar uma benção, uma oração naquele instante final, ou era a crença de que Deus estava ali agindo na doença para nos mostrar o mistério? É uma questão que nos fazia amadurecer na fé, sem essa dosagem de fé o padre com toda certeza se esvazia, se desencanta, se desestimula e não segue em frente. Então eu posso dizer que vivi momentos muito fortes, em que se dava adeus ao cansaço para poder atender às pessoas, a gente se submetia a um rigor, a um peso físico para atender, mas se sentia aliviado e feliz dentro do coração. Como bispo em Picos eu tive que fazer atendimento a cavalo algumas vezes, não foram muitas, aquilo me dava uma sensação que era importante e fundamental que Jesus chegasse àquela pessoa.

Como o senhor avalia os desafios do sacerdote de cinquenta anos atrás e do sacerdote de hoje?

Naturalmente o desafio maior é não deixar-se absorver pela secularização massiva, o tempo de hoje exerce um poder enorme, que é quase que um rolo compressor descartando a presença de Deus, porque o homem se envaideceu de certa maneira que ele se julga absoluto, se julga absolutamente capaz de colocar os seus princípios que negam a participação do próprio Deus, a ponto de negar criação do mundo, que Deus possa dar uma orientação. Tudo é um destino cego, portanto a negação absoluta de um Deus que se abre, quem vem a nós, que propõe um caminho, que abraçou a Cruz e propõe a cruz como caminho mais acertado para que tenha a salvação.

Tudo isso é um transtorno para um jovem que nasce nesse contexto, que vive nesse contexto, como ele ultrapassa tudo isso para apresentar ao povo uma dimensão de fé, uma dimensão escatológica de que para além daquilo que a gente vê, existe alguma coisa importante, que é Deus. Isso é um desafio muito grande, é preciso oração, é preciso intimidade com Deus para que a gente possa ajudar que os outros também penetrem nisso, nunca impor, porque não se trata de ensinar uma doutrina, mas de se transmitir o amor vivido por uma pessoa que é Jesus Cristo.

Assim como a vida, o trabalho de um sacerdote segue uma linha com início, meio e fim, como vai ser esse novo momento como Bispo Emérito?

Eu estou vivendo essa expectativa marcada pela certeza, por que no dia três tudo muda na minha vida, eu estou muito tranqüilo, compreendendo que aquela palavra de Paulo é muito verdadeira, que diz que "um planta, outro vem atrás rega, o outro vem depois e colhe", quer dizer, estou me convencendo que eu não tinha que fazer tudo e não sobrar nada pra ninguém, mas eu estou me convencendo que minha parcela chegou ao limite, outros vêm em seguida, eu fico alegre e feliz em saber que outro vai continuar.
Do ponto de vista humano eu pensaria "agora está tudo acabado, agora eu não sou nada, não sou ninguém", eu não estou pensando dessa maneira, estou com o pensamento bastante positivo, esperando que Deus me ajude que eu não caia num vazio como se tudo tivesse acabado. Vou tentar dar minha contribuição no que eu puder, já estou até pensando em dar uma viajada pelas comunidades onde trabalhei sem o rigor de uma data marcada, de um compromisso sério, me parece que seria uma ajuda boa de revitalizar minha vida e as comunidades.

O senhor já decidiu onde vai morar após essa mudança?

No momento presente eu ainda não bati o martelo, os pensamentos estão povoando a minha cabeça, há tendências muito fortes na direção de Brasília, há também alguns sinais na direção de Teresina, o próprio bispo que vai assumir pediu também que eu possa ficar com ele e eu tenho que cuidar um pouco da saúde, esse semestre vai ser para eu curtir um pouco e tomar essa decisão.
Recentemente o senhor visitou monsenhor Valdemir, que em breve assumirá o posto de bispo titular na Diocese de Floriano, como foi esse contato?

Um homem aberto, alegre, feliz, consciente da missão que vai assumir. Escolheu um lema muito bonito "Apascentas minhas ovelhas", está consciente do rigor do clima na nossa região, vai sair de um espaço físico favorável, mas vem com muito ardor no coração. Deu-me uma impressão muito boa de que é um homem experimentado na administração de diocese, ele é que é o Ecônomo da Diocese de Vitória da Conquista, uma pessoa muito bem formada, um currículo muito bom, fez oito anos na Itália também, então eu estou com muita esperança que ele vai ser um bom pastor entre nós.

 
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