quinta-feira, 26 de maio de 2011

O Testamento de Jesus: "não vos deixarei órfãos" (Jo 14, 18)



A liturgia do sexto domingo da páscoa continua a dar os significados profundos da ressurreição de Cristo para todos nós e já nos insere no clima de Pentecostes. De modo especial, temos presente, neste Domingo, o testamento de Jesus, ou seja, a sua promessa para os seus de continuarem a missão assistidos pelo Espírito da verdade.
A primeira leitura dos Atos dos Apóstolos (At 8,5-8.14-17) mostra exatamente o testemunho de Filipe que anuncia as multidões e estas o seguem com atenção (v. 6). O testemunho do homem escolhido enche a cidade de alegria e a faz tornar uma nação escolhida em escutá-lo.
Na segunda leitura o testamento deixado é que os corações sejam santificados para que estejam prontos a dar razões da esperança e, isso deve fazer na mansidão, respeito e com boa consciência (1Pd 3,15-16).
Mas qual é a finalidade do testamento de Jesus? De onde ele vem e para quem ele será? Para que se tenha testamento é preciso ter herança e qual a herança que Jesus quer deixar? Há um adágio conhecido em nosso tempo que diz a educação ser a maior herança que os pais podem deixar para seus filhos, mas Cristo não falou de sabedoria e sim do Testamento de não deixar órfãos (Jo 14, 18) os seus apóstolos.
Com efeito, só é capaz de herdar uma herança e de deixar algo em testamento quem tem um laço de amor, quem tem um apreço e um carinho por uma pessoa, pois ela não é adquirida nem deixada por meio de associações nem de sensacionalismos. Por isso, Jesus começa no evangelho dizendo: se me amais, guardareis os meus mandamentos (Jo 14, 15), dito com outras palavras, se me amais recebereis minha herança.
Por isso, o testamento deixado por Jesus é o Espírito da verdade (Jo 14, 17), o Defensor, o Paráclito, para os que amam, afim dos mesmos conduzirem a comunidade cristã em direção à verdade e levá-la a uma comunhão cada vez mais íntima com Jesus e com o Pai tornando-a "morada de Deus" no mundo e dando testemunho da salvação que Deus quer oferecer aos homens. 
Assim sendo, a comunidade reunida torna a testemunha da ação do Espírito que almeja levá-la à herança reservada. A multidão deixa seu estado de órfão e adquire pela imposição das mãos elevadas a confirmação de sua missão tornando-se preparada a dar razão de sua esperança como afirma São Pedro: santificai em vossos corações o Senhor Jesus Cristo e estai sempre prontos a dar razão da vossa esperança a todo aquele que vo-la pedir (1Pd 3, 15).
Por que Cristo resolve deixar o Espírito como testamento? A resposta encontra-se na primeira leitura deste domingo. Diz que Filipe anunciava em Samaria o Cristo e as multidões o escutavam e ficavam alegres, pois já eram batizadas (At 8, 16), no entanto, somente com a chegada de Pedro e João elas recebem o Espírito Santo. Por que isso? Provavelmente, significa que a adesão dos samaritanos ao Evangelho era superficial, talvez mais motivada pelos gestos espetaculares que acompanhavam a pregação de Filipe, do que por uma convicção bem fundada, e que não havia ainda, entre eles, uma verdadeira consciência de pertencer a essa grande família de Jesus que é a Igreja universal. O Espírito aparece, aqui, como o selo que comprova a pertença dos samaritanos, depois de unidos à Igreja universal e em comunhão com ela, à Igreja de Jesus Cristo.
Portanto, o batismo não é mera associação a Cristo, nem o Espírito Santo um "manancial" de sentimentos com a finalidade de consolar os aflitos, mas de confirmar os órfãos a herança prometida a qual já conhecemos por meio do próprio Cristo.
Mais quem são os órfãos de hoje?  No Antigo Testamento, o "órfão" é o protótipo do desvalido, do desamparado, do que está totalmente à mercê dos poderosos e que é a vítima de todas as injustiças. Jesus, porém não quer que os seus discípulos fiquem indefesos, pois Ele vai estar ao lado deles. Porém, os órfãos nos dias de hoje ocupam uma nova classe, talvez sejam aqueles que perderam o encanto pela Igreja de Jesus, os que se encontram imersos no "espírito do medo", que se alegram e dão ouvidos aos falsos profetas, que buscam outros defensores e acreditam apenas no material, neste mundo. A estes o Espírito da verdade continua sendo companheiro, mesmo estando em relação de oposição com o mundo, o qual não pode ver nem reconhecer (Jo 14, 17), mas permanece agindo como um mestre que explica as conseqüências daquilo que Jesus falou: não vos deixarei órfãos (Jo 14, 18).
Convictos que Cristo não rejeita nossa oração nem afasta para longe o seu amor (Sl 65, 4), peçamos, pois, ao Espírito da Verdade que nos faça homens da herança e nos dê a força do empenho necessário para sermos capazes de dar razões da esperança a tantas "multidões" que se encontram órfãs da Verdade, da comunidade de fé, que não mais encontram razões nem defensores para ajudarem a readquirirem a herança que Jesus deixou para cada um.  Assim seja amém!
Por Wagner Carvalho
Seminarista do 4º Ano de Teologia

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